3 de set. de 2012

criações


"Infelizmente, ninguém sabe o que faz que uma educação dê certo. E pais e filhos, perdidos (os primeiros no desespero e os segundos no desafio), acabam acreditando, um dia, como no caso do menino do Paraná, que o fundamento da autoridade e da rebeldia seja a força - eu te acorrento, e você vem com gilete.

Uma pesquisa famosa de Daniel Kahneman, em 2004 (para assinantes), constatou que criar filhos não é uma fonte de bem-estar. (...)

Seja como for, a criação dos filhos é uma experiência menos satisfatória do que todos queremos acreditar que seja.

O que foi? Será que, de repente, na modernidade, perdemos a mão, e ninguém sabe mais ser pai direito? Por que, na hora de educar, nossos avós pareciam se sair melhor do que a gente - com menos questionamentos e menos dramas?

É uma questão de expectativas: eles não esperavam nem um pouco que criar filhos lhes trouxesse a felicidade. E é uma questão de lugar: para eles, as crianças não eram o centro da vida dos adultos."

(Contardo Calligaris, aqui)

* * *

"Não aconselho - nunca aconselhei - ninguém a ter filhos. A ingrata e gloriosa arte de criar alguém nunca foi fácil, porém, acho que hoje as pessoas acrescentaram uns cinco níveis a mais de complicação, e todo mundo entra em desespero. (...)

Fico me perguntando o que dirão quando ela estiver maiorzinha e começarem a ver realmente a forma que estou criando [minha filha]. Não crio uma menininha, crio um ser humano. Quero que antes de entender a diferença entre os sexos minha filha aprenda a igualdade entre as pessoas."

(Rebeca, no Minoria é a Mãe)

* * *

Acho que criança tem que se sujar, tem que tocar o mundo sem tanto controle, tem que se desenvolver. E ninguém se desenvolve se for protegido demais, se tiver seu contato com todas as coisas milimetricamente cuidado, controlado, calculado, higienizado. Não canso de me surpreender com o exagero dos inúmeros produtos voltados ao que eu chamo de ‘esterilização do mundo’ (...).

Fico me perguntando se este tiro não há de sair pela culatra em um futuro não muito distante. Se não estaremos, com este zelo exagerado pela limpeza – melhor dizendo, pela assepsia absoluta em todas as esferas da vida – criando futuras gerações muito mais suscetíveis às bactérias que temos tentado a todo custo eliminar.

Um dos grandes aprendizados (e desafios) da maternidade é abrir mão do controle: desde a gravidez, aprendemos a relaxar, confiar, entregar – não sabemos quando o bebê vai nascer, quanto e quantas vezes há de querer mamar, quantas horas vai dormir, quando começará a engatinhar, andar, falar, ler, escrever. É assim também com o contato de nossas crianças com o mundo, com tudo o que ele tem a oferecer, de bom ou de ruim: não podemos controlar tudo, evitar tudo, proteger de tudo. E mesmo que pudéssemos, isso não traria para eles nada de bom.

Criança tem que tomar contato com o mundo, do jeito que ele é. Tem que estar livre e disposta diante de todas as coisas, tem que estar disponível para a investigação do mundo, e investigar o mundo é coisa que não se faz de luvas, de dentro de uma bolha, com medo do contato. É o contato que cria resistência, é pelo contato que o organismo se fortalece, aprende a reagir aos agentes estranhos, é pelo contato que se amadurece. É pelo contato que conhecemos o mundo, que nos entregamos à vida. A tal da ‘vitamina S’ (‘s’ de sujeira) pode fazer um bem danado para o organismo de nossos pequenos, se soubermos lidar com ela de maneira consciente, razoável, lúcida.

E o melhor de tudo: ela traz para a vida um gosto bom de alegria e liberdade. E quando esse gosto falta, isso sim é que faz um mal danado à saúde – do corpo e da alma.

(Tata, do Blog Mamíferas)

* * *

Em tempo: vale demais ler aqui a história do diretor de arte paraibano que apelou para Nick Fury para ajudar o filho, que teria de usar um tampão no olho para um tratamento contra hipermetropia.

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